Imagem de capa: Joe Dudeck
“Madame Crowls’s ghost” foi publicado pela primeira vez de forma anônima na revista All Year Round na edição de 31 de Dezembro de 1870. No ano seguinte, foi incluído na coletânea de contos Chronicles of Golden Friars. Nessa seguda edição “Madame Crowl’s ghost” é incorporado como parte do conto “A Strange Adventure in the Life of Miss Laura Mildmay” (Uma estranha aventura na vida da Srta. Laura Mildmay”) no qual é narrado por uma velha ama do Norte, a Sra. Jolliffe. A versão traduzida aqui é a original, publicada em All Yeard Round.
O conto é narrado por uma senhora de origem humilde, que trabalhou como empregada doméstica na juventude. Devido à origem social da narradora e ao fato de que ela é do norte da Inglaterra, o texto original (incluindo os diálogos de todos os personagens, que são contados por ela) é escrito foneticamente para simular seu sotaque e com “erros” que simulam um falar mais coloquial e mais distante da norma considerada culta/correta. Nesta tradução, tentei manter, na medida do possível, essas marcas de oralidade presentes no original.
…
Agora sou uma velha, mas tinha acabado de fazer treze anos quando fui pra a mansão Applewale. Minha tia era governanta lá, e uma carruagem dessas de um um cavalo ´té Lexhoe pra me levar pra Applewale, eu e meu baú.
Eu ´tava um pouco assustada quando cheguei em Lexhoe, e vi a carruagem e o cavalo. Queria voltar com a minha mãe pra Hazelden. Eu ´tava chorando quando entrei no “shay”—era assim que nós chamava as carruagem —e o velho John Mulbery, que era o cocheiro, e que era um homem muito bom, me comprou umas maçã no Golden Lion, pra me animar um pouquinho. Ele me disse tinha bolo de groselha, chá, e costeleta de porco esperando por mim, tudo quentinho, nos aposento da minha tia, lá no casarão. Era uma noite linda de lua, e eu fui comendo as maçãs e espiando pela janela da carruagem.
É muito feio quando os cavalheiro resolve assustar uma criança boba que nem eu era. Às vez, eu acho que é uma brincadeira de mal-gosto. Tinha dois cavalheiro sentado do meu lado. Depois que escureceu e apareceu a lua no céu, eles perguntou pra onde eu ‘tava indo. Então eu falei que ia trabalhar com a senhora Arabella Crowl, da mansão Applewale, perto de Lexhoe.
—Ora, ora— dise um — então você não vai se demorar muito por lá!
E olhei pra ele como quem diz: “e por que não?” como se eu fosse assim muito esperta.
—Porque,— ele respondeu —e jure pela sua vida que não vai contar isso a ninguém, basta olhar pra ver que a velha está possuída pelo diabo e por mais de um fantasma. Você tem uma Bíblia?
—Sim, senhor.— Eu sabia que a minha mãe tinha guardado minha Bibliazinha no meu baú. Eu ainda guardo até hoje, mesmo as letra sendo muito pequenininha pra minha vista cansada.
Quando olhei pra ele e fiz que “Sim, Senhor”, eu até achei que ele tinha piscado pra o amigo dele, mas não vi com certeza.
—Bem—ele falou—se certifique de colocar sua Bíblia debaixo do colchão todas as noite, que ela vai manter as garra da velha longe de você.
Imagine só como eu fiquei apavorada quando ele disse isso! Eu queria perguntar muita coisa sobre a senhora pra ele, mas eu era muito tímida e os dois ia conversando sobre os assuntos dele, ´té a hora de eu descer da carruagem, como já disse, em Lexhoe. Meu coração gelou quando fui descendo por uma alameda assim escura. As árvores eram tudo grande, cheia de galho, todas velha que nem a casa. Quatro pessoa, com os braços bem aberto tocando só as pontinha dos dedo não conseguia abraçar uma daquela.
Estiquei o pescoço pra olhar pela janela, querendo ver o casarão pela primeira vez; e, de repente já ‘tava bem na frente dela.
Era uma casa grande, toda preta e branca, com umas viga de madeira preta que ia de um lado a outro e até em cima, e as telha virada pra fora, tudo branquinha igual uma folha de papel. Com a luz da lua e as sombra das árvore, que era umas duas ou três bem em frente, dava pra até pra contar as folha e os painel de vidro em formato de diamante, que ´tava brilhando na janela, e tinha umas persiana grande, bem à moda antiga, na parede pra o lado de fora, e as outra janela ‘tava tudo aferrolhada, porque só tinha três ou quatro empregados, e a velha senhora, então os outros quarto ficava tudo trancado.
Fiquei com o coração nas mão quando a viagem acabou me apareceu aquele casarão pela frente, sando que lá dentro ´tava minha tia que eu nem conhecia aquela tal de Senhora Crowl que eu ia ajudar a cuidar, mas já tinha era medo dela.
Entrei pelo corredor, e minha tia me deu um beijo e me levou pra o quarto dela. Ela era alta e magra, e muito branca com os olhos negro, e a mão fina, comprida, de luva preta. Já tinha mais de cinquenta anos, e era de pouca palavra. Mas ali dentro a palavra dela era lei. Não tenho o que me queixar dela, mas era uma mulher dura. Acho que ela tinha sido mais carinhosa comigo se eu fosse filha da irmã dela, e não do irmão. Mas isso não importa mais.
O fidalgo, que se chamava Chevenix Crowl, era o neto da Senhora Crowl, e ele vinha visitar duas ou três vez por ano, pra ver se a velhinha ‘tava sendo bem cuidada. Durante todo o tempo que morei em Applewale, só vi ele duas vez.
A velhinha era bem tratada apesar de tudo, isso porque minha tia e a Meg Wyvern, que era a criada, tinham uma consciência, e cumpriam bem o dever delas.
A Sra. Wyvern- minha tia chamava só de Meg Wyvern, mas que eu tinha que chamar de Sra. Wyvern- era uma moça gorda e alegre de uns 50 anos, bem alta e bem larga, que andava meio devagar mas ´tava sempre de bom humor. Ela tinha um salário bem bom, mas era assim meio mão-de-vaca. As roupa fina dela ficava tudo trancadas a chave, e ela só vestia um vestido de algodão cor de chocolate com uma estampa de folha e bolinhas vermelha, amarela e verde, que durou foi muito.
Ela nunca me deu nada, nem sequer um dedal, o tempo todo eu morei lá, mas ela ´tava sempre alegre, sempre rindo, e conversava sem parar na hora do chá. Quando ela me viu ali tão novinha e triste, ela me animava com sua gargalhada e suas história. Eu acho que gostava mais dela do que da minha tia—criança gosta de se divertir e de ouvir história. Minha tia era muito boa pra mim, mas ela era muito rígida com algumas coisa e muito quieta.
A minha tia me levou até o quarto de dormir dela pra eu descansar um pouco enquanto ela preparava o chá na antecâmara. Mas antes, ela botou a mão no meu ombro, e disse que eu era uma moça alta pra a minha idade, que tinha crescido bem, e me perguntou se eu sabia fazer o serviço de casa e costurar. Então ela olhou bem no meu rosto, e disse que eu parecia com meu pai, que era irmão dela, e já tinha morrido, e que ela esperava que eu fosse uma cristã melhor, e que trabalhasse e me comportasse bem.
Achei que ela foi meio dura, por ser a primeira vez que me conhecia.
Depois fui pra o quarto que ficada do lado do quarto de dormir dela, e era o escritório da governanta — era muito confortável, carvalho por todo o lado— tinha um belo fogo aceso, com carvão, turfa, e madeira, chá na mesa, bolo quentinho, e carne fumaçando. A Sra. Wyvern ‘tava lá, gorda, alegre, e conversando. Ela falava mais em uma hora do que minha tia falava em um ano inteiro.
Eu fiquei tomando meu chá, e minha tia subiu pra ver a Senhora Crowl.
—Ela está indo ver se a velha Judith Squailes está acordada— a Sra. Wyvern me explicou — A Judith fica com a Sra. Crowl quando eu e a Sra Shutters (esse era o nome da minha tia) não ´tá lá. Ela é uma velhinha difícil. Tem que ficar esperta, senão ela acaba dentro da lareira ou janela afora. Ela é danada, mesmo tão velha.
—Qual a idade dela? —perguntei
—Fez noventa e três no último aniversário, e isso já faz uns oito meses. E não fique fazendo essas pergunta na frente da sua tia. Só cuide da velhinha e pronto.
—A senhora podia me explicar o que eu vou ter que fazer pra ela?
—A velhinha? Bem, a sua tia, a Sra. Shutters, vai explicar tudinho; mas eu acho que você vai ter que ficar lá no quarto sentadinha com as suas costuras, e vigiar pra ela não fazer nenhuma travessura. Deixe ela brincar com as coisinha dela lá na mesa, e se ela pedir comida ou alguma coisa pra beber você dá. Só não deixe ela fazer traquinagem e se ela ficar muito difícil, é só tocar a sineta bem alto.
—Ela é surda?
—Não, nem surda nem cega. E esperta que só. Mas ‘tá meio gagá, não lembra as coisas direito. Pra ela tanto faz ler “João e o pé de feijão” ou os despacho do Parlamento, que ela se diverte igual.
—E por quê a outra menina foi-se embora, a senhora sabe? A que foi embora sexta-feira passada? Minha tia escreveu pra a minha mãe e contou.
—É, ela foi embora.
—E por quê? — perguntei de novo.
—Eu acho que ela nunca explicou pra a Sra.Shutters. Não sei. Não fique falando disso. Sua tia não gosta de menina faladeira.
—E a velhinha está bem de saúde? —perguntei
—Não tem problema perguntar isso.Ela anda meio confusa, mas deu uma melhorada na semana passada. Acho que ela ainda passa dos cem anos. Vixi! Lá vem sua tia.
Minha tia entrou e começou a conversar com a Sra. Wyvern, e eu fui me sentindo assim mais em casa e fiquei andando pelo quarto, olhando as coisa. Tinha um jogo de porcelana bem antigo na cristaleira e uns quadro nas parede. Tinha um porta. Assim escondida nos painel de madeira, e aberta. Aí eu olhei ali dentro, e vi um casaco de couro muito estranho com umas fivela e as manga comprida do tamanho das colunas de uma cama.
—O que você ‘tá fazendo aí, menina? —minha tia ralhou, bem quando eu ´tava achando que ela nem ‘tava me olhando. —O que é isso na sua mão?
—Isso, senhora? — respondi e virei pra mostrar o casaco. —Não sei o que é, não, senhora.
Minha tia era muito branca, mas as bochecha dela ficou vermelha e os olho brilhando de raiva. Acho que se não fosse a distância entre nós duas, ela tinha me batido. Mas ela me agarrou pelo ombro, e tirou o casaco da minha mão, e disse:
—Enquanto ‘tiver aqui não fique mexendo no que não é seu.
Aí, ela pendurou o casaco de volta no gancho, e bateu a porta e trancou.
A Sra. Wyvern jogou as mão pra cima e ficou rindo lá na cadeira dela, se balançando como ela fazia sempre que ‘tava se divertindo.
Meu olho ficou cheio de lágrima, então ela piscou pra a minha tia, chorando também, só que de tanto rir, e disse:
—Para com isso, a menina não fez por mal. Vem aqui, criança. Isso só um par de muleta de pato manco. Agora não fique fazendo pergunta qu nós não vamos ter que mentir pra você. Venha cá, sente e tome alguma coisa antes de ir pra a cama.
Meu quarto, veja bem, ficava no andar de cima, do lado do quarto da velhinha. A Sra. Wyvern dormia no quarto dela, em uma cama bem ao lado da cama dela. Eu tinha que ficar de prontidão caso me chamassem.
A velhinha andava numa das birras dela. Ela costumava ficar de mau humor. Às vezes ela não deixava ninguém vestir ela, e outras vezes ela não deixava tirar a roupa dela. Diziam que ela era uma beleza de linda quando era nova. Mas ninguém em Applewale lembrava dela quando ‘tava no auge. Ela gostava muito de vestido, e tinha muita seda grossa, muito cetim engomado, veludo e renda de tudo que era jeito, o bastante pra abrir pelo menos umas sete loja de tecido. Todos os vestido dela era fora de moda e esquisito, mas valia uma fortuna.
Bem, eu fui pra a minha cama. Fiquei na cama acordada por um tempo, porque tudo era muito novo pra mim e acho que o chá perturbou os meus nervo, pois não era acostumada a tomar chá, só em dia de festa. Aí, eu ouvi a Sra. Wyvern a falando. Escutei com a mão na orelha, mas não consegui ouvir a Sra. Crowl, e acho que ela não disse nada.
Ela era muito bem-cuidada. Os empregado de Applewale sabiam que quando ela morresse, eles ia ser tudo demitido, mas enquanto ela era viva eles eram bem-pago e tinha uma vida boa.
O médico vinha duas vez por semana pra examinar a senhora, e claro que os empregado fazia tudo o que ele mandava direitinho. Uma coisa era sempre igaul: eles não podiam contrariar nem aborrecer a velhinha de jeito nenhum. Tinha que fazer tudo o que ela queria e agradar ela em tudo.
Então ela foi pra a cama naquela noite com a roupa do dia, e no dia seguinte, não falou nem uma palavra. Eu fiquei fazendo meu bordado o dia todo, no meu quarto, e só desci pra jantar.
Eu tinha vontade de ter visto a senhora, até de ouvir ela falar. Mas ela podia estar ali ou Londres que eu nem ia perceber a diferença.
Depois do jantar, minha tia me mandou passear por uma hora. Eu fiquei feliz quando voltei. As árvore era tão grande, e o jardim era tão escuro, tão solitário, e o céu nublado… Eu até chorei, lembrando da minha casa, andando por ali sozinha. Naquela noite, acenderam as velas todas. Eu ‘tava sentada no meu quarto, e a porta ´tava aberta no quarto da Madame Crowl, onde ‘tava a minha tia. Foi aí que eu ouvi pela primeira vez o que eu achei que era a velhinha falando.
Era um som estranho, eu não sei se parecia com um bicho ou um pássaro, mas tinha um quê de lamúria, assim bem baixinho.
Eu fiquei ouvindo, prestando bastante atenção. Mas não dava pra entender nem uma palavra. Então, minha tia respondeu:
—O maligno não pode machucar ninguém, senhora, que Deus não permite.
A mesma voz estranha respondeu alguma coisa, lá da cama.
E minha tia faolou de novo:
—Deixe eles fazer caretas e ficarem falando o que eles quiser, senhora. Se o Senhor é por nós, quem será contra nós?
Eu fiquei escutando com a orelha grudada na porta, sem nem respirar, mas nem mais um som, nem uma palavra veio do outro quarto. Uns vinte minutos depois, quando eu ‘tava sentada junto da mesa, olhando as gravura das fábula de Esopo, vi alguma coisa se mexendo na porta. Eu olhei e vi o rosto da minha tia olhando pra dentro, com a mão levantada.
—Psiu! —ela fez bem baixinho e veio de pontinha do pé e cochichou: —Graças a Deus ela dormiu. Não dê nem um pio até eu voltar. Vou descer pra pegar uma xícara de chá e já volto. Eu vou com a Sra. Wyvern, porque nós vamos dormir no quarto dela. Você pode descer quando nós voltar. A Judith vai servir o seu jantar no meu quarto.
E lá foi ela.
Eu continuei olhando as gravuras do livro, e de vez em quando ficava escutando, mas não ouvi nenhum barulho, nem de respiração. Comecei a conversar com as gravura pra me acalmar, porque já ‘tava ficando era com medo daquele quarto tão grande.
Foi aí que eu me levantei e comecei a andar pelo quarto, olhando aqui, mexendo ali, pra me distrair, você entende. Até que eu não tive mais o que fazer e fui espiar o quarto da Senhora Crowl.
Eram um quarto grande com uma cama das de dossel com cortina de seda florida quase da altura do teto até o chão, todas fechada. Tinha um espelho, o maior espelho que eu já vi, e o quarto todo iluminado que parecia ‘té que tava pegando fogo. Eu contei vinte e duas vela, todas acesa. Era uma mania dela, então ninguém contrariava.
Eu fiquei ali na porta, de boca aberta, olhando tudo. Não dava pra ouvir nem um suspiro, as cortinas nem se mexia. Criei coragem e entrei na pontinha dos pé, olhando tudo em volta. Eu me vi no espelho grande, e só o que me veio na cabeça foi “Bem que eu podia dar uma olhadinha na velha ali na cama.”
Vocês vão achar que eu era uma tonta, de querer tanto ver a Sra. Crowl, mas eu pensei com meus botão que seu eu não olho agora, vai demorar muito pra ter outra chance de ver ela.
Bem, meus querido, eu fui pra junto da cama, e as cortinas ‘tava fechada, meu coração tava quase me me dando um revertério. Mas eu me enchi de coragem, e encostei os dedo nas cortina grossa e peguei ela na minha mão. Aí eu fiquei esperando, mas ‘tava tudo quieto que nem se fosse uma tumba. Eu fui abrindo a cortina bem, bem devagarzinho. E ela ali, bem na minha frente, deitada que nem naquela pintura no túmulo da igreja de Lexhoe, da famosa Sra. Crowl da mansão Applewale. Ali, toda bem-vestida. A gente não vê mais umas roupa daquela hoje em dia, Cetim e seda, verde e escarlate, com renda dourada e colorida. Nossa, era uma visão! Ela ‘tava usando uma peruca grandona e empoada, quase da altura dela mesma e, oh, eu nunca vi tanta ruga! O pescoço pelancudo coberto de pó de arroz, e as bochecha pintada de ruge, as sobrancelhas que parecia uns rabinho de rato que a Sra. Wyvern tinha que desenhar nela. Ela ‘tava bem ali, toda rica e dura, com um par de meia de seda e sapato de salto alto nos pé. Ora, veja! O nariz era assim fino e torto, e dava pra ver uma parte do branco dos olho. Ela costumava ficar de pé na frente do espelho, toda vestida daquele jeito, rindo e babando, com um leque numa mão, e um arranjo de flor enfeitando o corpete. As mãozinha enrugada bem esticadinha assim uma de cada lado, e as unha comprida, pontuda de um jeito que eu nunca tinha visto. Talvez fosse a moda das pessoa rica usar as unha daquele jeito?
Eu acho que vocês iam se assustar se tivesse visto aquilo. Eu não conseguia soltar a cortina, nem me mexer nem um cadinho, nem tirar meus olho dela, meu coração parecia que parou. E num instante ela abriu os olho, e sentou, e virou, e botou os pé de salto alto no chão, me olhando, me olhando bem na minha cara com aqueles olhão vidrado, e um sorriso malvado na boca cheia de ruga e de dentadura.
Veja bem, um cadáver é uma coisa normal, mas aquilo? Aquilo foi a coisa mais horrível que eu já vi na minha vida, Os dedo dela retinhos apontando pra mim, e as costas curvada, corcunda de tão velha que ela era. Aí ela disse:
—Oh, cordeirinho! Por que você disse que eu matei o menino? Vou lhe fazer cocégas até não aguentar mais!
Se eu tivesse pensado por um instante, tinha virado e corrido porta afora. Mas eu não conseguia tirar os olho dela, e fui me afastando como pude. Ela veio na minha direção, estalando como se fosse um boneco daquele de pendurar nos fio. Os dedo dela ‘tava vindo direto pra a minha garganta, ela ficava fazendo um barulho com a língua, assim zizzz-zizzz-zizzz.
Eu fui recuando e recuando o mais rápido que consegui, e os dedo dela quase na minha garganta. Eu acho que tinha bastado ela me tocar pra eu endoidecer.
Eu fui recuando até ficar encolhida num canto, e dei um grito, que parecia até que minha alma ‘tava saindo do corpo. No mesmo minuto, minha tia apareceu na porta e deu um berro, aí a velha virou pra ela. Eu sai correndo de volta pra o meu quarto, o mais rápido que minhas pernas conseguiram me carregar.
Só posso dizer que chorei muito quando cheguei no escritório da governanta. A Sra. Wyvern morreu de rir quando eu contei o que tinha acontecido. Mas ela mudou de cara quando eu contei o que a velha falou.
—Repete isso.— ela pediu.
E eu repeti.
——Oh, cordeirinho! Por que você disse que eu matei o menino? Vou lhe fazer cocégas até não aguentar mais
—Você disse que ela matou um menino?
—Não senhora, não disse não. — respondi
Depois disso, a Judith ficava sempre comigo, quando as duas empregada mais velhas não ‘tava cuidando da senhora. Eu preferia pular de uma janela do que ficar sozinha com a velha.
Foi mais ou menos uma semana depois, pelo que eu me lembro, eu ‘tava sozinha com a Sra. Wyvern um dia, e ela me contou uma coisa sobre a Senhora Crowl que eu não sabia
Quando ela era nova e linda, e isso já faz mais de 70 anos, ela se casou com o Fidalgo Crowl de Applewale. Mas ele era viúvo e já tinha um filho de uns nove anos.
Ninguém nunca soube o que aconteceu com esse menino. Uma certa manhã ele sumiu, e ninguém sabia onde ele tinha ido parar. Davam muita liberdade pro menino. Ele costumava sair de manhã e ir na cabana do vigia tomar café da manhã com ele, depois ia pra a criação de coelho, e não voltava pra casa até tarde. De vez em quando ele ia pra o lago, tomava banho e ficava o dia todo pescando por lá, ou remando num bote. Então, ninguém sabia o que tinha acontecido com ele, só que acharam o chapéu dele perto do lago, debaixo dum pé de espinheiro branco que ‘tá lá até hoje. Todo mundo pensou que ele tinha entrado n’água e se afogado. Então o filho do Fidalgo com a Sra. Crowl, que vivia bem longe, voltou pra a propriedade. Quando eu cheguei em Applewale o dono das terra era o filho desse filho, Chevenix Crowl, o neto da velha.
Antes ‘té da época da minha tia, o povo já falava que a velha sabia alguma coisa do sumiço do menino, mas que não queria admitir. Diziam que ela manipulava o marido, mentindo e adulando ele. Mas como o menino nunca apareceu, o assunto foi ficando esquecido.
Agora eu vou contar o que eu vi com meus próprio olho.
Não fazia nem seis meses que eu ‘tava lá, era inverno, foi quando a senhora ficou doente pela última vez.
O médico ‘tava preocupado que ela tivesse um ataque de loucura. Fazia quinze anos que ela teve um ataque desse, e tiveram que colocar ela numa camisa de força várias vezes. Era o casaco que eu tinha visto no armário do quarto da minha tia.
Mas não foi isso que aconteceu. Ela gemia e se retorcia e foi morrendo aos pouquinhos, bem devagar, até um dia ou dois antes de passar dessa pra melhor. Foi aí que ela começou a delirar e dar uns grito que parecia ‘té que um bandido tinha entrado no quarto e colocado uma faca na garganta dela. Ela saía da cama, mas mas como não tinha força nem pra andar e nem pra ficar de pé, ela caía no chão e ficava apoiada nas mão velha e murcha, implorando por piedade.
Já deu pra adivinhar que eu não entrava naquele quarto por nada. Eu ficava na minha cama tremendo de medo dos berros e gemidos que ela dava. Ela ficava falando umas coisas de deixar o cabelo em pé.
Ficava sempre com ela a minha tia, a Sra, Wyvern, a Judith Squailes e uma moça que mandaram buscar em Lexhoe. E quando mais ela tinha aqueles ataque, mais ela ia minguando.
O pároco foi lá, e rezou com ela, mas ela já nem conseguia rezar mais. Acho que era o certo, mas ninguém achava que ia adiantar. Quando ela finalmente descansou, e acabou tudo aquilo, enrolaram a velha Sra. Crowl em uma mortalha, colocaram ela num caixão e chamaram o Sr. Chevenix. Mas ele ‘tava na França, e como ia demorar muito, o pároco e o doutor concordaram que não dava pra deixar a pobre ali sem enterro. Ninguém apareceu no funeral, foi só deles dois, minha tia e nós tudo que trabalhava em Applewale. Então a velha senhora de Applewale foi enterrada no mausoléu da família na igreja de Lexhoe, e nós ficamos morando na mansão até o senhor voltar e decidir o que ia fazer, e pagar nossas contas se fosse o caso de demitir nós tudo.
Me mudaram de quarto pra um que ficava duas porta de distância do quarto da Senhora Crowl. Mas aconteceu uma coisa, umas duas noite antes do Sr. Chevenix voltar pra Applewale.
O meu quarto novo era grande e quadrado, todo coberto de painel de carvalho, mas sem nenhum móvel a não ser a minha cama que não tinha cortina, uma cadeira e uma mesa, o que era um nada num quarto grande daquele. E o espelho grande, que a senhora costumava usar pra se admirar quando era nova, agora já não servia pra nada, então ficou no meu quarto, encostado numa parede, porque tinha muita coisa pra tirar do quarto dela, como ela vivia confinada lá.
Veio a notícia que o Fidalgo ia chegar em Applewale na manhã seguinte, e eu fiquei feliz, porque tinha certeza que ia voltar pra casa, pra a minha mãe. Eu fiquei tão feliz, pensando na minha casa, na minha irmã Janet, no gatinho e nas tortas, e em Trimmer, que era bebezinho e tudo o mais, que fiquei até nervosa e nem conseguia dormir. O relógio deu meia-noite e eu lá, acordada naquele quarto escuro que nem um breu. Eu ‘tava de costa pra a porta, olhando pra a parede.
Acho que era mais ou menos meia-noite e quinze quando eu vi uma luz na parede, como se tivesse um fogo atrás de mim. As sombra da cama, da cadeira e do meu vestido que ‘tava pendurado num gancho na outra parede parecia que ‘tavam dançando nos painel de carvalho e nas vigas do teto. Eu virei de supetão, achando que alguma coisa tinha fogo.
E o que eu vi, só por Deus! A velha ‘tava bem ali, mortinha e toda coberta de cetim e veludo, sorrindo feito uma louca, os olho arregalado naquela cara que parecia mais a cara de um demônio! Tinha uma luz vermelha ao redor dela, como um resplendor, como se a barra do vestido tivesse pegado fogo. Ela vinha bem na minha direção, com as mão velha e seca levantada como se ela fosse me arranhar. Eu não conseguia nem me mexer, mas ela passou direto por mim feito uma rajada de ar frio, e eu vi, ela foi até a parede, até a alcova, como minha tia costumava chamar, que era um buraco na pare onde a cama costumava ficar antigamente, e ficou procurando alguma coisa com as mão. Eu nunca tinha visto aquela porta antes. Aí ela virou como se tivesse umas rodinha de girar, sorriu pra mim e o quarto ficou todo escuro. Eu ‘tava longe da minha cama, nem sei fui parar ali, e quando minha fala voltou, eu comecei a gritar e saí desembestada pelo corredor. Quase arranquei a porta do quarto da Sra. Wyvern, por pouco não matei ela de susto.
Claro que eu não dormi no meu quarto naquela noite, e assim que amanheceu fui correndo atrás da minha tia.
Minha tia não brigou nem me chamou a atenção, como eu ‘tava esperando. Ela só segurou minha mão e olhou bem no meu rosto. Ela me falou quer era pra eu não ter medo, e me perguntou:
—A aparição ‘tava com uma chave na mão?
—´Tava! — foi aí que eu lembrei—Uma chave grande, pendurada num gancho esquisito.
—Fica aqui.— ela soltou a minha mão e abriu a porta dum armário.
—Uma chave assim? — ela pegou uma chave e me mostrou, com uma cara muito séria.
—Era essa mesmo!
—Tem certeza? — ela ficou virando a chave.
—Certeza. — eu achei ‘té que ia desmaiar quando respondi.
—Tudo bem, criança, tudo bem. — ela disse bem baixinho e voltou a guardar a chave.
—O Senhor vai chegar hoje, antes de meio-dia, e você vai contar tudo isso pra ele. Eu acho que logo vou ter que ir me embora, então é melhor mandar você de volta pra casa hoje à tarde. Eu vou procurar outro emprego pra você assim que eu puder.
Como dá pra imaginar, eu fiquei foi feliz de ouvir isso.
Minha tia fez as minhas mala, e me pagou as três libra* que eu tinha direito, pra levar pra casa. O Sr. Crowl chegou a Applewale naquele dia mesmo. Ele era um homem bonito, de uns trinta ano. Aquela foi a segunda vez que eu vi ele. Mas foi a primeira vez que ele falou comigo.
Minha tia conversou com ele no escritório da governanta, mas eu não sei o que eles falaram. Eu tinha um pouco de medo dele, porque ele era um figurão importante em Lexhoe, então não me atrevi nem a chegar perto até ele me chamar. Ele sorriu pra mim e disse:
—O quê você viu, menina? Deve de ter sido um sonho, porque você sabe muito bem que isso de fantasma não existe. Mas seja lá o foi, mocinha, sente e conte tudo desde o começo.
Assim que eu terminei de falar, ele ficou pensando por um tempo, e disse pra minha tia:
—Eu conheço bem essa casa. Na época de Sir Oliver, o Wyndel manco me contou que tinha uma porta naquele recesso, à esquerda, onde a menina sonhou que viu minha avó abrindo uma porta. Ele já tinha mais de oitenta anos quando me contou isso, e eu era moleque ainda. Já faz uns 20 anos. A prataria e as joia ficavam guardadas lá, há muito tempo atrás, antes de ter o cofre da sala das tapeçarias. Ele me disse que a chave ficava num gancho de latão. Foi isso que a senhora disse que encontrou na caixa que minha avó guardava os leques. Não ia ser estranho encontrar umas colher ou uns diamante esquecido por lá? Vem, menina, me mostre exatamente aonde foi.
Senhor… meu coração ‘tava pra sair pela boca, e me agarrei na mão da minha tia quando entrei de novo naquele quarto medonho. Mostrei a eles de onde ela tinha vindo, onde ela passou por mim e o lugar onde ela parou, onde parecia que tinha uma porta.
Tinha um armário velho ali junto da parede, e quando saiu dava pra ver o contorno certinho de uma porta nos painel, e o buraco de fechadura encaixado na madeira, lisinho igual o resto da parede. As junta da porta ‘tava coberta com uma massa da cor de carvalho, mas as dobradiça apareceu quando saiu o armário, só que não dava pra adivinhar que tinha uma porta ali.
—Aha! — ele deu um sorriso estranho —Parece que é isso aqui!
Levou alguns minutos com um cinzel pequeninho e um martelo pra tirar o pedaço de madeira do buraco da fechadura. A chave encaixou, claro, e girou de um jeito estranho, deu um rangido comprido, aí a fechadura destravou e a porta abriu.
Tinha outra porta lá dentro, inda mais esquisita que a primeira, mas não tinha tranca então abriu bem fácil. Dentro tinha um quarto apertado, com parede e teto de tijolo. Não dava pra ver o que tinha dentro, porque ‘tava escuro feito breu.
Minha tia acendeu uma vela, e o senhor pegou e entrou.
Minha tia ficou na ponta dos pés pra olhar por cima do ombro dele, mas eu não vi nada.
—Ah! Ah! — fez o fidalgo, e deu um pulo. —O que é isso? Me dá o atiçador, rápido! — ele falou pra minha tia. Quando ela foi ‘té a lareira, eu espiei por trás do braço dele e vi, ali agachado num canto, um macaco ou um bicho parecido, com o peito todo esfolado. A coisa mais enrugada, murcha e seca que eu já vi na minha vida.
Minha tia olhou por cima do ombro do senhor, quando foi entregar o atiçador pra ele e disse:
—Meu Deus! Cuidado com o que vai fazer, senhor. Vamos sair e fechar essa porta!
Mas em vez de escutar ela e tomar cuidado, ele segurou o atiçador como se fosse uma espada, foi e cutucou aquela coisa. Ela se desmanchou toda, a cabeça caiu e tudo virou uma pilha de osso e poeira, pequeninha assim.
Eram os osso de uma criança, e o resto tudinho se esfarinhou só de tocar. Ninguém falou nada por um tempo, mas aí o senhor deu a volta ao redor da caveira que caída no chão.
Mesmo eu sendo jovenzinha, percebi muito bem o que ele ‘tava pensando. Aí ele disse:
—É um gato morto! — e botou todo mundo pra fora, apagou a vela e fechou a porta. —Depois nós dois voltamo, Sra. Shutters, pra dar uma olhada nas prateleira com calma. Agora tem outros assunto pra resolver, e a senhora disse que a mocinha vai voltar pra casa, não foi? — aí ele botou a mão no meu ombro — Ela já recebeu o salário de direito, mas vou lhe dar um presente.
Ele me deu uma libra de ouro**, e me mandaram pra Lexhoe mais ou menos uma hora depois e de lá eu peguei uma carruagem. Fiquei tão feliz de voltar pra casa, e nunca mais vi a velha senhora Crowl de Applewale, nem em aparição nem em sonho, graças ao bom Deus.
Mas quando eu cresci e fiquei mulher feita, minha tia veio passar um dia e uma noite comigo em Littleham e me contou que não tinha mais dúvida de que o pobre menininho que tinha desaparecido fazia tanto tempo tinha sido trancado pra morrer naquele buraco por aquela velha maldita. Dali não dava pra ouvir os grito e o choro dele, e como o chapéu dele tinha ficado na beira d’água, todo mundo achou que ele tinha se afogado. As roupas dele tinham se desmanchado, virado pó naquele quartinho onde dos osso. Mas encontraram uns botão de azeviche, uma faquinha de cabo verde e umas moedinha que o pobrezinho com certeza tinha no bolso, eu acho, quando prenderam ele ali pra nunca mais ver a luz do dia. E no meio da papelada do fidalgo encontraram uma cópia do anúncio que o antigo Senhor mandou fazer porque ´tava pensando que foi os cigano que levou o filho dele, e no anúncio dizia que o menino tinha uma faca de cabo verde, e que os botão da roupa dele era feito de azeviche.
E é só isso que tenho pra contar da velha Sra. Crowl da mansão de Applewale.
Notas da Tradutora:
* Três libras em 1870 (quando o conto foi escrito) seria equivalente a cerca 360 libras atuais
**Libra de ouro, também chamada de “sovereign”, era moeda com valor nominal de 1 libra, mas que era feita com uma porcentagem de ouro, que tornava seu valor absoluto menos sujeito a inflação. Por essa razão ela podia ser guardada como forma de investimento.
Josie, você merece o céu! (ou qualquer outra concepção de um estado de boa aventurança post mortem.😄)
Merece pelo blog inteiro, claro, mas não poderia deixar de comentar especificamente aqui, com o Le Fanu. Pra mim ele meio que se tornou um símbolo das lacunas da literatura gótica que as editoras brasileiras parecem determinadas a NÃO preencher. Tipo, toda vez que rola de alguma editora anunciar algum projeto com o Le Fanu… é sempre Carmilla de novo! Eu amo Carmilla, sem dúvida, mas não precisamos de mais Carmillas (só eu tenho sete traduções diferentes, entre edições físicas e virtuais!) precisamos é de “Uncle Silas”, ‘The Purcell Papers”, “The Wyvern Mystery” e, é claro, “Madam Crowl’s Ghost and Other Tales of Mystery” traduzidos para o português. E, pelo visto, a única esperança de vermos isso acontecer será com tradutoras independentes e destemidas como você.🖤
Muito, muito obrigado mesmo por estar ajudando a preencher tantas lacunas.😉
Rodrigo…
P.S. A Biblioteca Noturna tem instagram?
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Querido! Que bom te ver por aqui de novo!
Muito obrigada pelo comentário! É sempre uma alegria saber que alguém passou por aqui e curtiu uma das minhas traduções. Você tem toda a razão, existe mesmo essa questão no mercado editorial brasileiro e não só com o LeFanu. Dentro do universo da literatura de terror/horror há uma certa tendência a sempre traduzir os mesmos autores, ou até a mesma obra, caso de Carmilla mesmo. Isso acontece especialmente com autores mais “antigos”. Talvez tenha a ver com popularidade de autores mais atuais, ou com o fato de o gosto do público tender para certos estilos específicos de terror e horror, especialmente graças à influência do cinema. Seja lá qual for a razão essa lacuna existe, e é um dos motivos pelos quais eu fiz esse blog.
Mas vou te confessar uma coisa, o LeFanu em especial me intimida um pouco como tradudora. Mas acho que agora que eu “quebrei o gelo” com a Sra. Crowl, o LeFanu vai aparecere por aqui mais vezes com certeza.
Novamente, muito obrigada pelo apoio e o carinho!
(e sobre o instagram…ainda não. Estou criando coragem de fazer umas mídias sociais para o blog. Ainda estou meio escondidinha aqui entre as estantes da Biblioteca, haha)
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Voltei aqui porque fiquei intrigado… Le Fanu te intimida como tradutora mais do que, por exemplo, o M.R. James?
Só pra contextualizar a pergunta, meu conhecimento de inglês não é dos mais aprofundados, me viro bem pra traduzir legendas e dar conta de entender artigos e ensaios, mas estou longe de conseguir ler literatura com tranquilidade (e, sobretudo, prazer). Dito isso, dessa minha posição, sempre tive a impressão de que o James é que era particularmente complicado, não tinha ideia que o Le Fanu poderia ser ainda mais intimidador.
Falei das redes sociais, mas na verdade nem sei realmente até que ponto valem a pena quando a ideia é atrair leitores. Uso o instagram mais pela “sensação” de maior interatividade porque o blog em si é muito difícil de saber exatamente quanto de atenção atrai. Mas depois do apagão que rolou nas redes do Sr. Zuckerberg (no dia seguinte ao meu último comentário aqui) até me arrependi de ter falado nisso, rsss…
Mas ao menos as redes ajudam mais do que comentários a manter contato e trocar ideias. Enfim, sei lá. Abandonei o facebook logo no começo da pandemia e, sinceramente, achei que sentiria falta… mas não sinto. Instagram tem sido mais do que suficiente (e Telegram, pra quem vai virando amigo mais próximo). Somando tudo, não sei mesmo se não é mais satisfatório ficar escondido entres as estantes, rssss…
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Olá! Em primeiro lugar desculpe a quase imperdoavelmente longa demora em responder, fiquei um mês longe do blog (logo durante o Halloween, veja só…mas a vida tem dessas)
Então, eu não sei se a minha dificuldade com o LeFanu é algo apenas meu ou se outros tradutores também tem uma experiência similar, mas para mim particularmente o M.R. James é mais “familiar”. Eu venho de uma formação de história e ciências humanas e o James escreve como um acadêmico. É parte do estilo particular dele, na verdade. Os textos dele são facilmente identificáveis como escritos de um historiador. Desde a escolha do vocabulário (termos técnicos da área de história, arquitetura, geografia, que alguém como eu está mais acostumado) até a maneira como ele constróis as frases. Tem algo muito “lógico” no estilo dele para quem está acostumado a ler publicações acadêmicas, pois ele escreve quase como quem escreve uma tese. Ele também costuma usar uma estrutura narrativa bem particular dele, então por mais que certas frases sejam complexas por conta de vocabulário ou de construções mais rebuscadas, a estrutura da história é clara, então o tradutor pode contar com isso para organizar o próprio pensamento e destrinchar o texto. Finalmente, os contos dele foram pensados para ser lidos em voz alta para outros professores e alunos, então há uma “voz” definida ali, uma voz de professor diante da classe, que tem elementos acadêmicos, mas também uma certa coloquialidade.
O LeFanu é muito mais literário no sentido em que estamos acostumados. As descrições dele são mais “poéticas”, mais subjetivas. Ele varia bastante a “voz” do seu texto. Há muito de “historiador” nos textos dele, mas ele também coloca ali elementos de outros estilos, como as sensation novels, os romances góticos…ele brinca mais com diferentes narrativas e imagens. O texto dele é mais psicológico que o texto do James, e menos formulaico. Ele também dá voz a personagens diferentes. Enquanto os narradores do James são sempre os mesmos homens de classe média e alta (que falam um inglês perfeito), os de LeFanu variam mais, e ele marca essa diferença no uso de vocabulário, estruturas e dialetos. O Fantasma da Senhora Crowl, por exemplo, é inteiramente narrado por uma mulher da classe trabalhadora que fala com um sotaque marcado do norte da Inglaterra. Alguns trechos são difíceis até de entender durante a leitura, quanto mais traduzir.
Os dois tem coisas em comum (até porque o LeFanu foi a maior inspiração do M.R.James), principalmente a ênfase na sutileza, na ambientação, e no “não-dito”, mas o James tem mais daquela necessidade de “clareza” do acadêmico, enquanto o LeFanu consegue ser mais “obscuro”.
Pois é, estou pensando em maneiras de atrair mias leitores para o blog, mas por enquanto acho que estou precisando mesmo é achar tempo para produzir conteúdo. Quem sabe quando tiver uma rotina de publicação mais regrada não valha a pena pensar em investir em alguma rede social.
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